quarta-feira, abril 27, 2005

O Silencio quando nao me encanta, me espanta.

O gosto amargo em minha boca do alcool de ontem a noite refresca minha memoria a ponto de relembrar a mistura de descontentamento e alivio vivido em meu mundo vinte e quatro horas atras. Alheio ao que acontecia aos olhares que recebi e aos alertas de mim mesmo, me senti um pouco mal. Foi tardio. Eu perdi o show do Dirty Sanchez que segundo o Geezer foi o melhor dos ultimos tres. Talves essa minha certeza de saber o que quero, de nao provar nada a ninguem, me faz distante de certas partes da cidade e pessoas e quando me vejo colado aos seus ombros descubro que ja nao faco questao. Porem minha locacao descorreta eleva-me acima de voce; eh aqui onde ja sei quem sou que flutuo e te vejo de cima como uma mapa em minhas maos.

Estou em pe com a xicara na mao, o cafe quente, o disco girando e o Sol que se adentra pela porta da cozinha ainda com o raios frios de primavera reflete meus olhos que nada veem. As flores ainda estao por vir. Tardio. Na sala niguem. Nos quartos ninguem. No hall ninguem. Ninguem. O silencio quando nao me encanta me espanta. E me espanca de peso na consciencia. Ainda eh muito cedo pra tomar outro cafe; tenho uns trabalhos pra fazer, devo esperar. Vou ficar mais um pouco aqui congelado escutando a secadora rodar e a musica que vem de muito longe comeca a tocar.
Lembro que a vinte anos atras eu estava fazendo o mesmo em outro local, menor, piralho. Desenhava uma vida em minha cabeca que nao existia e que me iludiu. Era primavera no Brasil e tambem estava frio. Eu enxergava meus amigos em suas casas, era sempre nublado. Eu molhado brincava na cozinha, a mesa uma muralha as cadeiras meus carros. Meus amigos bonitos e minhas amigas safadas. A minha maior lamentacao eh saber que muitas dessas memorias que hoje tenho sao mentiras, foram criadas em tempos passados dentro de minha cabeca quando delas materializei as acoes. Descobri que apos anos nossa memoria nos engana.

Ontem quando cheguei em casa liguei a TV mas nao vi nada. O filme rodou ate o fim, mas nao percebi. Estava longe. Tenho essa impressao de sentir as coisas passando e nao estar acompanhando. O trem passa e voce fica. Talves o mais facil seria entrar na frente e ver o que acontece: se voce eh forte o suficiente pode ser carregado de energia e exaltacao, ou de outra forma, esmagado e afogado em desilusoes e amarguras.
Minha cabeca se encontra a mil ao lado do trem implorando pra entrar. Nao sei se devo acreditar.
Eu quero justica.