segunda-feira, outubro 01, 2007

Percepção de Sonny

Sonny fica quieto e coloca o lanche de volta no prato. Comenta sobre a chuva que desenha novas formas em veias d'agua no vidro da janela, e continua: "Enquanto voce nao prejudica ninguem que esta ao lado, eu acho que qualquer forma de erro eh valida. E que para esse tipo de acao, nenhuma pessoa deveria se sentir arrependimenta. Nao ha bem ou mal. Ou certo ou errado. De uma forma ou de outra, voce foi para algum lugar e continua seu caminho. Talvez, a vida nao eh aquela que voce gostaria que fosse? Bem, mas eh exatamente o que voce eh, o que voce tem e onde voce esta. Eh isso eh muito importante: o valor da percepcao das certas razoes que o fazem ser o que voce eh.

Sabe aquele arrepio na espinha que as vezes sentimos dentro de uma fracao de segundos? As vezes eu sinto uma onda de felicidade explendida que invade meu corpo, bem parecido com o arrepio. Nao eh nada sexual ou macilioso. As raras vezes que senti essa ligeira micro-tempestade de ecstasy percorrer meu coracao, eu estava sozinho, preso num olhar ou no caminho a cozinha, e sempre dei um sorriso, ali contemplado com o extraordinario, sem mais ninguem ao redor a ver.
O que quero dizer eh que esse momento de felicidade, traduz a sensacao de estar realmente percebendo aquele exato momento. Lucido, desfocado da realidade que nos eh fornecida como verdade e vivendo uma outra, tao simples e especial."

Terminamos o cafe e saimos. A chuva cessou, o ceu continuava cinza e Sonny nao parava de falar. Parecia estar revelando algo precioso. Me contou de que quando era crianca, nunca gostava de pedir os brinquedos ou jogos mais populares. Disse nao ter possuido nenhum dos brinquedos icones que entraram para a historia dos seus amigos de infancia. "eu nao gostava do muito obvio, procurava sempre uma alternativa. Eh louco como o nosso passado reflete o que somos hoje. Mais louco ainda, eh saber que podemos descobrir o futuro usando essa mesma base, essa formula que constroe o que a gente eh."

Foi uma otima e longa tarde. Depois fiquei alimentando dezenas de questoes, das quais eu nao queria mais saber as respostas, mas sim viver o processo do porque elas foram ditas. Fiquei feliz por Sonny, de ve-lo como ele eh e sempre foi. De falar o momento, as vezes sem pensar. De viver o pensamento e o sonho, as vezes sem dormir. De ter os amigos que tem. Fiquei orgulhoso em saber que Sonny continua a olhar para frente, com a cabeca erguida.